terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Dilema

A ida da folha traz um pouco de drama à vida da flor.
Afinal, uma parte dela está se indo, esvaindo.
Mas não um drama total,
Será um bem necessário.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Mais uma noite caiu

Sala-de-estar. Mais uma manhã. Manhã que antecede o trabalho. Mesa com um jornal de hoje jogado como se tivesse sido lido. Ele, ainda com roupas de casa. Ela, com o desleixo afeito ao ambiente do lar. Também duas xícaras de café na mesa. Café no fogo.

- Carolina, você passou a minha roupa do trabalho?

- Sim, está em cima da cama. Pois bem, escute, você acha que sou sua escrava é?

- Ei, ei, ei... calma lá. O que é que te fiz?

- Quero saber. Diga, onde estava ontem que chegou tão tarde?

- Eu te falei, falei que tinha uma reunião de trabalho. Acaso não lembra? Na semana passada, te disse.

- Fale a verdade, Fernando. Você não se envergonha disso?

- Mas, que diabos, já falei a verdade. Sempre falo. Se quiser, acredite.

Enquanto Fernando estava lendo o jornal, Carolina olhava-o com uma mágoa ainda não conhecida por sua alma. Mágoa que ia deixando desfiar os caminhos das palavras por aquela manhã. Algo a fazia sentir extremo ódio de todos os gestos torpes de Fernando.

- Deixa esse jornal enquanto come! Que coisa suja! Ou então lave as mãos...

- Carolina, acho que você está testando minha paciência hoje. Mas vamos lá, largo então esta merda de jornal.

Fernando sai da sala em um átimo de irritação e vai verificar a roupa do trabalho no quarto. Carolina, terminando o café na cozinha, fica remoendo a lembrança de cada gesto de Fernando. Já não agüenta mais.

Ele volta do quarto, já pronto com a roupa do trabalho. Prepara-se para comer. Coloca o café já pronto em uma xícara, açúcar e põe-se a mexê-lo. Carolina não suporta.

- Fernando, você está me irritando com isso. Por que toma tanto café? Isso faz mal.

- Gosto de café. Ainda mais, dá um gás grande para trabalhar.

- E por que coloca tanto açúcar?

- Carolina, eu não coloquei nem tanto assim.

- Mas você me irrita em mexer tanto essa porcaria de café. Pare com isso!

- O que é que você tem hoje, mulher?

- Fernando, precisamos conversar.

- Sobre o quê?

- Sobre isso de você ficar mentindo para mim.

- Mas já te disse, não menti para você. Apenas fui a uma reunião, foram estabelecidas novas normas para o trabalho. E por que você mistura tudo?

- Não misturo nada. Você que não presta atenção no que falo. Então acha que está tudo misturado.

- Agora mais essa!

- Pois saiba bem que não vou me recatar enquanto você me faz de idiota saindo por aí, usando o pretexto da reunião como trunfo. Vou fazer um chá, café faz mal. Quer?

- Não, não.

- Sabe o que é pior, é a sua indiferença. Você já pensou? Já pensou que não é o único?

- Já pensou que enquanto você me deixa só, vem outro e toma o vazio que você fez questão de deixar?

- Do que está falando, Carolina? Vamos conversar.

- Não quero mais. Não quero conversar com você. Você mente pra mim o tempo todo e não se envergonha disso.

- Acho melhor mesmo conversamos depois. Você está alterada, querendo discutir. Vou trabalhar. Encontro você mais tarde.

Fernando bateu a porta e saiu sem mais explicações.

Carolina ficou mesmo atônita. Irrompeu em lágrimas no sofá. Não sabia por que sentira aquilo tudo. Apenas sentia. Ficou a rememorar o tempo que poderia ter ficado supenso. O tempo em que ela achava que Fernando não mentia para ela. Ou em como aquilo tudo poderia não ter acontecido. Deixou- se cair no chão inebriada de tantas lágrimas.

Caiu a tarde, e Carolina dormia intensamente.

Ao anoitecer, Fernando chegou. Olhou a cena espantado. A esposa simplesmente dormia ali no chão e acalmava o cansaço do choro e da discussão acontecida pela manhã. Ele se aproximou. Ela acordou assustada. Ele pegou-a no colo. Ela então se desfez em seu peito. Mais um dia se foi. Mais uma noite caiu.